quinta-feira, 14 de junho de 2012

Casos trabalhistas bizarros na justiça

Casos trabalhistas bizarros na justiça
 
por Vinicius Segalla  |  Ano 2009
 
Parece filme classe B, mas não é. A Justiça do Trabalho nasceu para defender o trabalhador de eventuais excessos das corporações, mas, às vezes, as alegações chegam às raias do absurdo, como disse em sentença um juiz do trabalho 

Sentenciou o juiz: É evidente que fimose não tem qualquer relação com o trabalho, jamais podendo ser caracterizada como doença ocupacional. Sabe-se que fimose é a dificuldade ou mesmo a impossibilidade de expor a glande do pênis em razão de o prepúcio ter um anel muito estreito. Como ninguém deve deixar o pênis exposto no trabalho, não pode haver relação entre o citado membro e o labor desempenhado na empresa. Aliás, chega às raias do absurdo a alegação do reclamante.

O juiz em questão é Platon Teixeira de Azevedo Neto, da 8ª Vara do Trabalho de Goiânia, e o reclamante um ajudante geral da Mac Transportes e Logística Ltda., de Goiânia, representado pela advogada Gislene Maria de Oliveira, a qual defende que o ex-funcionário, seu cliente, tendo adquirido doença laboral durante as atividades que exercia, teria direito a uma indenização.

Soa estranho uma ação dessa natureza? Pois saiba que nas 3 milhões de reclamações julgadas anualmente pelas varas trabalhistas há casos que chegam a ser bizarros e com decisões a favor tanto de trabalhadores como de empregadores.

No final do ano passado, o desembargador Ricardo Artur Costa e Trigueiros, da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo), deu ganho de causa a uma ex-funcionária de uma empresa de produtos para estética, de Cotia (SP), demitida por justa causa. Motivo alegado: flatulência. O desembargador justificou a decisão:

“A eliminação involuntária, conquanto possa gerar constran-gimentos e, até mesmo, piadas e brincadeiras, não há de ter reflexo para a vida contratual. Desse modo, não se tem como presumir má-fé por parte da empregada, quanto ao ocorrido, restando insubsistente, por injusta e abusiva, a advertência pespegada, e bem assim, a justa causa que lhe sobreveio”.

Na caso da fimose, a empresa chegou a requerer que o ex-funcionário fosse multado por litigância de má-fé, que é quando alguém entra na Justiça ou age durante um processo de modo a obter vantagens ilícitas. O juiz negou, mas, na sentença, ironizou: “Impossível alegar que o problema no membro atingido pudesse provocar perda ou redução da capacidade para o trabalho, já que o ‘dito cujo’ não deve ser usado no ambiente de trabalho”. A propulsão, acrescentou, só pode ser debitada aos responsáveis quando comprovadamente provocada, ultrapassando assim o limite do razoável.

Segundo o juiz, “o direito de ação é assegurado constitucionalmente e, em alguns casos, o uso, ainda que de forma imprópria, deve ser tolerado, pois, muitas vezes, nada mais é do que a busca do cidadão por uma justiça que não é feita no âmbito político”. A má distribuição de renda e a desinformação, explica o magistrado, às vezes, levam o trabalhador a se socorrer do Judiciário apenas para ter uma resposta.

Outros casos

Numa ação trabalhista que começou há dez anos, um ex-degustador de cerveja alega que, por causa de sua atividade laboral, que presumia, segundo ele, a ingestão diária de 16 a 25 copos de cerveja em um turno de oito horas, cinco ou seis dias por semana, tornou-se alcoólatra. O outro lado é a fábrica de bebidas AmBev.

O juiz de primeira instância negou o pedido, mas o cidadão apelou. Veio a condenação, pelo Tribunal Regional do Trabalho (2ª Instância), com a seguinte explicação:“(A empresa teve) conduta negligente, uma vez que atribuiu ao empregado a função de degustador, apesar de sua condição de saúde, bem como não fiscalizou o consumo da bebida". Condenação: pagamento de R$ 100 mil por danos morais ao ex-funcionário.

A empresa não desistiu. Entrou com recurso especial no Tribunal Superior do Trabalho (TST), a última instância da Justiça Trabalhista. Argumentou que o funcionário já tinha predisposição ao alcoolismo, conforme atesta seu histórico familiar, anexado ao processo. Os ministros do TST afirmaram que o conhecimento da predisposição do funcionário para o alcoolismo seria motivo suficiente para não designá-lo para a função de degustador de cerveja.

Em resposta ao CanalRh, a AmBev informa, em nota, que o processo, iniciado em 1998, antes mesmo da fusão que originou a empresa em 2000, refere-se a uma antiga cervejaria e reitera que nunca permitiu o consumo de bebidas alcoólicas nas dependências de suas unidades fabris. Para funções técnicas específicas, diz o comunicado, o consumo é acompanhado de rigoroso controle médico, que inclui diversos procedimentos, como exames de sangue, neurológicos, hepáticos e acompanhamento psicológico. “A empresa, que hoje responde pelo passivo jurídico da cervejaria incorporada, informa que analisará a decisão visando definir as próximas medidas em relação ao processo judicial.”

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