sábado, 16 de abril de 2011

BELÉM/PA: Falha estrutural levou Real Class ao chão

16.04.2011

Falha estrutural levou Real Class ao chão

Falha estrutural levou Real Class ao chão (Foto: Marcelo Lelis)
(Foto: Marcelo Lelis)

Erro no cálculo estrutural e uso de material inadequado na obra. Essas foram as causas oficiais do desabamento do edifício Real Class, segundo relatório da perícia do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves, apresentado ontem. O resultado deve servir de prova importante para o inquérito aberto na Polícia Civil para investigar os culpados pela queda do prédio, que causou a morte de três pessoas, em janeiro deste ano.

Segundo o perito Dorival Pinheiro, que coordenou os trabalhos do CPC, houve erro “no projeto, com falha na concepção do sistema estrutural, erro na escolha do modelo matemático (usado para avaliar e monitorar a obra) e no dimensionamento e detalhamento dos estribos dos pilares da obra”. Os estribos são ferros retorcidos que servem para “amarrar” as colunas de ferros usados nos pilares de sustentação do prédio.

Além disso, foi detectado que a bitola (diâmetro) do ferro era menor que o recomendado nos dois pilares centrais do prédio. Os pilares de ferro deveriam ter pelo menos 5mm, mas tinham 4,2mm.

Dorival concluiu que houve “falhas na concepção do sistema estrutural e que o prédio não deveria ter 34 andares”.

Ele disse ainda que não houve sinais nos andares superiores de que o prédio pudesse desabar, como fissuras e rachaduras. Mas, ninguém sabe a situação em que se encontrava o subsolo. Lá a perícia apresentou um outro erro da obra: “O subsolo não tinha iluminação adequada e era usado como depósito. Não teria como se perceber fissuras no local”, declarou. Outro ponto importante na investigação dos peritos foi o fato de que eles descartaram a ação do vento, que foi considerado como principal fator da queda da estrutura no laudo emitido por engenheiros ligados ao Curso de Engenharia Civil da UFPA. A análise dos peritos foi toda feita com os indícios e materiais coletados no local do acidente. Os peritos legais rechaçaram qualquer comparação entre as duas análises.

Ele confirmou ainda que nos documentos analisados, a Real Engenharia não teria emitido ao projetista um termo de aceitação do projeto. “Na segunda-feira, após o sinistro, tivemos acesso aos documentos necessários apreendidos na sede da Real Engenharia, pelo delegado Rogério, e isso deu a tranquilidade necessária para fazermos o trabalho no tempo certo”, avaliou.

Engenheiro será ouvido na quarta

O laudo foi entregue também ao delegado Rogério Moraes, titular da Delegacia de Ordem Administrativa (DOA), da Divisão de Investigação e Operações Especiais (Dioe), responsável pelo inquérito. Rogério informou que agora o laudo será analisado e anexado ao inquérito policial. “Vamos avaliar a necessidade de outros interrogatórios e depoimentos de pessoas que estavam no local e dos responsáveis, e solicitar todas as diligências necessárias”, afirmou.

Quem for indiciado deverá responder por homicídio culposo, sem intenção de matar. Inicialmente, o inquérito deve apontar o engenheiro Raimundo Lobato, responsável pelo cálculo estrutural da obra, como o principal indiciado, mas o delegado não descarta incluir a empresa. Raimundo será ouvido pelo delegado na próxima quarta-feira, às 14h30, na sede da Dioe. Rogério confirmou que pretende concluir o inquérito e encaminhá-lo ao Ministério Público do Estado até o próximo dia 29 de abril.

O documento foi apresentado oficialmente em coletiva na manhã de ontem, por Dorival e pelo diretor do Renato Chaves, Orlando Salgado, além do Secretário de segurança pública Luiz Fernandes Rocha. O relatório tem 23 páginas e traz detalhes sobre documentação e as análises feitas nos materiais colhidos no local de desabamento.

Construtora vai confrontar laudos

Falhas no cálculo estrutural já haviam sido foram apontadas como causa do desabamento, no laudo realizado por um grupo de engenheiros ligados a Faculdade de Engenharia da UFPA contratados pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-PA). O documento divulgado no mês de março apontou que os diversos pilares no nível do pavimento térreo não apresentavam resistência compatível com os esforços atuantes e incluíram o vento como um dos principais fatores, agora descartado no laudo oficial do Centro de Perícias Renato Chaves.

José Viana, presidente do Crea, disse que o conselho “tem interesses no laudo”. “O laudo foi elaborado por profissionais habilitados, então vamos avaliá-lo na Câmara Especializada de Engenharia Civil”.

O DIÁRIO tentou falar com o coordenador da Câmara de Engenharia Civil, Alexandre Ferreira, mas não conseguiu. Cleber Rabelo, diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Belém informou que o sindicato deve debater o resultado e o quê fazer em assembléia da diretoria neste sábado, em horário a ser confirmado.

Advogado da Real Engenharia, Roberto Lauria, informou que a empresa ainda precisa avaliar o laudo antes de se manifestar. “O delegado ficou de disponibilizar o laudo para a defesa e vamos ter um posicionamento na próxima semana”, garante.

Lauria diz que a Real vai confrontar a perícia do CPC com a perícia particular contratada pela empresa. A reportagem tentou contato com o engenheiro Nagib Charone, responsável pelo laudo contratado pela Real, mas não conseguiu.

Famílias esperam por indenizações

Entre as famílias das vítimas, resta aguardar o andamento dos processos movidos contra a empresa Real Engenharia, que dependiam também da divulgação do laudo oficial do Renato Chaves. Rosemiro Barros, filho de José Paula Barros, um dos operários mortos, informou que no próximo dia 18, às 11h, haverá uma audiência no Tribunal de Justiça do Trabalho. “Eles estavam pagando pensão e cortaram o salário do pai. E o valor da indenização, é a Justiça que vai decidir”, informou. “Nós somos pacíficos, não gostamos de briga. A justiça de Deus que vai determinar. Vamos ver o que vai acontecer”. Antônio Emídio Araújo, viúvo de dona Maria Raimunda Santos, considera precipitado se manifestar. “Preciso conversar com meus filhos e ver o que fazer. Aguardamos nossa indenização material e moral e estamos atrás disso”, reiterou. “Acabaram com meu lar, minha vida. Minha vida ficou de cabeça pra baixo”.

(Diário do Pará)

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